Carta aberta do juiz fluminense Marcos Peixoto ao jornal O Globo em 09 de abril de 2012
Criminologia

Carta aberta do juiz fluminense Marcos Peixoto ao jornal O Globo em 09 de abril de 2012



Hoje, 09 de abril  de 2012, o Globo ? este grande jornal (melhor diríamos: este jornal grande) a serviço do desserviço ? apresenta duas manchetes: ?Quatro em dez jovens infratores reincidem? e ?Violência faz outra vítima em Niterói?.
O que estas duas notícias têm em comum? Numa única palavra: hipocrisia.
Hipocrisia ligada a dois sistemas hipócritas: as UPPs e o Direito Penal e Infracional enquanto pretensas panaceias, incensadas por esta mesma grande mídia que, agora, por força das circunstâncias, aqui e ali começa mui timidamente ? e, como sempre, superficialmente ? a criticá-las ? afinal, o que realmente importa é vender jornal, lucrar muito e, para tanto, de olho na classe média e seus reclamos!
Até bem pouco tempo (e estamos longe do fim, é verdade...), em matéria de práticas ilícitas (dos pobres, que fique bem entendido...) a grita geral era no sentido de mais punição e punição maior. Não está funcionando? Aumentemos as penas. Não funcionou, diminuamos a idade penal. E por aí vai...
Os institutos correcionais (este grade eufemismo para senzalas modernas) para maiores e menores de idade nunca estiveram tão inchados de almas lá atulhadas em condições indignas quiçá de animais irracionais (por muito menos, as sociedades protetoras de animais fazem um escândalo ? e com razão!). São os nossos imensos tapetes, para baixo do qual se pretende varrer a ?sujeira? deixada por aí pelo sistema neoliberal, ao melhor estilo ?o que os olhos não veem... o capitalista não sente?.
Mas nada disso funcionou...
O grave problema é que este sistema nada resolve ? como nada resolvem as UPPs. Os dois só mudam o problema de domicílio e identidade. Razão? Foco incorreto.
Pacificaram-se comunidades? Quais? Aquelas em que foram (ou estão a ser) instaladas as UPPs e nas quais os índices de homicídio aumentaram ? Rocinha, por exemplo? Ou aquelas que receberam os criminosos fugitivos das UPPs e nas quais os índices de homicídio aumentaram ? Niterói, por exemplo?
Cidadãos imersos na criminalidade não são resgatados com polícia, nem prisão. A prisão os deteriora, enquanto a polícia não lhes confere o que necessitam efetivamente para mudar de vida: educação, saúde, esporte, emprego, programas concretos e amplos de reinserção social para egressos ? são meros exemplos.
Mas este não é o foco. Prefere-se investir no desfoco. E aqui estamos.
Marcos Peixoto



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